sexta-feira, 29 de abril de 2011

Mídia Social & American way

Você já teve a sensação de que chegou atrasada(o) à discussão de algum assunto? Por exemplo: todo mundo já está comentando o assunto há tempos e você só se interessou por ele recentemente. Compreende?

É assim que me sinto em matéria de mídia social. No entanto, a minha sensação de atraso ganhou o status de certeza quando recebi um pedido para preencher um formulário online conforme abaixo:

Name:
Website:
Facebook:
Twitter ID:
StumbleUpon ID:
Digg ID:
Redit ID:

Talvez você faça parte do grupo que já discute o conteúdo desses sites há tempos; eu não. Por isso, a quem possa ser útil, explico. Com a filosofia semelhante às redes de pessoas (facebook e twitter), outras empresas, como a www.stumbleupon.com, www.digg.com e www.redit.com, definem-se por conectar pessoas, possivelmente estranhas umas as outras, que comunguem gostos afins, formando um conjunto de videos e textos compartilhados que funcionam como canais de TV na web; quem estiver associado, pode “zapear os canais”.

Pela ausência de fronteiras, as redes sociais passaram a ser redes internacionais de negócios, produtos, pesquisa de consumo, dentre outras coisas aparentemente inimagináveis, que vêm liderando os gostos mundiais. Há quem diga que você não é mais só você, você é uma brand (marca) e tem que parecer bom, para poder vender o seu próprio peixe. Se antes os músicos estavam lutando para não terem suas obras copiadas, hoje muitos devem estar rezando para serem baixadas a todo vapor. Quem não for baixado não será ouvido, dizem por aí. 

A comuncicação através das redes sociais tornou-se tão popular que a vice-presidente de operações do facebook, Sheryl Sandberg, chegou a afirmar que o email está ameaçado de extinção; e complementou: “se vocês querem saber o que vamos fazer amanhã, observe o que os adolescentes estão fazendo hoje. De acordo com as pesquisas, os jovens utilizam-se mais do twitter, sms e das redes sociais para se comunicarem do que do email”. http://www.fastcompany.com/1660619/facebook-coo-sheryl-sandberg-on-the-end-of-e-mail-branding-in-social-networks.

Segundo esses estudos, os produtos indicados por amigos têm 400% mais chance de ser comprado; o estudo revela ainda que um produto recomendado tem 68% mais  reconhecimento (lembrança) pelos consumidores. Partindo do presuposto da veracidade dos dados, não me surpreenderei se recebermos ligações de telemarketing oferecendo produtos em troca de uma indicação na rede social.

“Caro cliente, por favor, aceite esse cereal e comente o seu sabor na sua rede de amigos.”

Se a moda pegar, será possível o seguinte diálogo:

“Aonde você vai nas suas férias?”

“Ao Caribe, com tudo pago, pois indiquei o hotel na minha rede social e ganhei estadia.”

Considerando o conceito de indicação, o site http://www.yelp.com/ , cujo slogan é real people real review, vive das recomendações dos seus usuários (não pode ser coincidência o fato de o yelp ter nascido dentro do facebook). O site http://www.overmundo.com.br tem essa característica, porém não se baseia somente no princípio da recomendação.

Independentemente de qualquer discussão de natureza sociológica que o assunto enseja, é indubitável a capacidade que os americanos têm de se auto-inventarem, seja na American way usada pelo personagem do Great Gatsby, que inventou a pessoa que queria ser, ou pela maneira arrojada do Mark Zuckerberg, que parece estar levando parte do mundo a praticar isso.

Hello world! I am late, but I am here!




Nota: se quiser ler sobre personal brand, clique no link a seguir:
http://www.bookyourselfsolid.com/new/wp-content/uploads/2010/12/BookYourselfSolid-Chapter3-PersonalBranding.pdf

sábado, 23 de abril de 2011

Nosso perfil

“Quem eu sou?” “Quem você é?” Será que conseguiríamos responder a essa questão pra lá de filosófica, sem nos confundirmos com os nossos títulos e documentos? Se disséssemos simplesmente que não sabemos, soaria demasiado honesto, ou nada atraente. Para evitar qualquer mal entendido entre nós e o mundo, ou pouco entusiástico da minha parte, farei como tenho visto por aí; apresentarei aqui os meus títulos, documentos e afinidades.

A começar pela primeira certidão. Nasci no Piauí, no nordeste brasileiro, em setembro de 1973. Esse dado, por si só, contém vários títulos. De acordo com o zodíaco, sou do signo de virgem. Pelo horóscopo chinês, o ano indica que sou o discreto búfalo, e o lugar indica que sou do sertão. Unindo os pontos de vista astrológico do leste e do oeste, posso ser considerada um búfalo virgem do sertão, e parodiando o filme "Um peixe chamado Wanda", apresento um búfalo chamado Sílvia.

Tenho também certificado de bons antecedentes. Devo registrar que sou filha de gente boa e dedicada. Se desandei foi por decisão própria; eles não têm culpa de nada; sempre me permitiram ser livre.

Fiz faculdade, pós-graduação e mestrado. Trabalhei em empresas, escritórios e centro de pesquisa. Se agora você está me dando mais valor, eu compreendo. 

Houve uma época na qual eu também me confundia com os meus diplomas e cargos, e me perguntava até onde aquilo tudo me levaria. 

Certa vez, eu me imaginei na porta do céu, conversando Deus, diante da famosa TV de plasma, assistindo ao resumo do currículo da vida, e me perguntando: será que ele me concederia algum privilégio?

“Mestrado? Huuumm, muito bem, milha filha. Vejo que você também fala idiomas. Pra começar, você pode escolher o seu camisolão; depois explicarei melhor sobre as suas vantagens.” Diria Deus.

Naquele período de confusão do “eu” com os “meus”, eu trabalhava para ter dinheiro e reconhecimento de que eu era competente, a mais abnegada e indispensável, ter um lugar de destaque, que me separasse dos comuns.

“Minha filha”, continuaria Deus, “vejo que você fez de tudo para agradar gregos e troianos. Por isso, você poderá morar naquele castelo celeste mais afastado.”

Sim, é possível dizer que eu queria ser o máximo aos olhos dos outros, achando que isso faria o máximo de mim mesma. Ledo engano.

Aos poucos, observei que o meu vazio vivia cheio por um triz, e se secava, pela mínima mudança das condições normais de temperatura e pressão. De modo que comecei a me identificar com quem dizia que trabalho não é fim, é meio de vida.

Passei a trabalhar para viajar, pagar os meus cursos, e para um dia ficar livre. “Se e quando” passaram a trabalhar diariamente comigo. “Quando eu entrar de férias”, “se sexta-feira for enforcada, vou poder fazer o que quero”.

Tudo estava tranquilamente suportável, porém insustentável, sob o ponto de vista da coerência. E, por ironia ou por coincidência, para onde eu olhava, surgiam pessoas que viviam o presente com a força de cento e vinte cavalos, pessoas que sonhavam, criando projetos, e realizando. 

Dentre esses seres vivos, um moço, que consertava sanfonas relatou: “eu passo o dia inteirinho brincando; olhe, eu fico doidinho quando alguém me traz aquela sanfona toda escangalhada pra consertar”. Ele, sem querer, acertou no meu calcanhar de Aquiles, e isso fez com que eu me suspeitasse ainda mais.

Por conta do “se, do quando, dos cento e vinte cavalos, da conversa com a divindade máxima e daquela sanfona”, minha relação com o trabalho foi, aos poucos, transformando-se numa bomba-relógio.

“Prepare-se, junte dinheiro, faça alguma coisa, porque “quando ou se” essa bomba explodir, espero que sobre alguém pra contar a história”, dizia uma voz ligeiramente familiar.

Tic-tac-tic-tac.

Bum.

Nem tão simples nem tão complexo. Mudei de trabalho, e depois mudei de tudo, ou tudo foi mudando. Acredite. As “coisas” movimentam-se por si só; como uma espécie de caos ambulante. Hoje, de alguma maneira, estou autossustentável, talvez por um triz, mas quem se importa?

O importante é que, por todas as razões do mundo, estamos aqui, concectadas(os) pelos oceanos, mares, bares, cafés, alegrias, tristezas, (in)sanidades, trabalhos, projetos, amores e fantasias. Desse caldo orgânico nasceu o meu blog sertão livre (ou se você preferir, ser tão livre), como laboratório de ensaios, reflexões e intercâmbio de “sanfonas”.

“Senhor Deus”, eu diria, “eu me enganei, não pretendo ter um lugar de destaque nem isolado, desejo me misturar com o mundo pra sentir a unicidade de cada um.”

“Ah, essas mulheres podem realmente mudar o curso da história.” Responderia Deus, orgulhoso.


Ei, você, que está lendo do outro lado, fale a verdade, a gente não se parece?




Outros posts sobre o assunto:

sexta-feira, 22 de abril de 2011

6 Dicas pra quem quer começar alguma coisa

Você certamente tem alguma coisa só sua, que inspira muita gente. Se você tiver algum blog(projeto) ou quiser interagir, não se acanhe. Seguem as dicas que me ajudaram a realizar alguma coisa.

1) Rascunhe a sua ideia; não precisa estar pronta ou funcionando; se você ficar guardando porque acha que a sua ideia é genial e não começar a fazer, alguém vai ter a iniciativa, porque as ideias têm vida própria;

2) Estude e pesquise o assunto; hoje em dia está tudo no ar;

3) Depois de estudar um pouco, converse com as pessoas (qualquer uma) sobre o seu ponto;

4) Faça um curso; se não tiver dinheiro, na internet você vai encontrar alguém disposto a explicar o assunto, seja no www.youtube.com , ou no www.ted.com, dentre outros;

5) Peça ajuda aos amigos (tenho alguns amigos que leem e criticam os meus textos, o que me deixa mais confiante);

      6) Deixe o medo da crítica fora do seu projeto.

Se você estiver se perguntando quem sou eu pra ficar dando conselhos pra você, a resposta é simples: sou uma em 6.914713 bilhões de seres humanos existentes na Terra; um encontro quase impossível. No entanto, estamos aqui uma(um) diante da outra(o), unidas por palavras e wireless.

Depois de começar a executar o seu projeto, conta como se deu o seu processo; isso poderá ajudar outras pessoas. Se não der em nada, já deu em alguma coisa.


Compartilhamento de fonte de inspiração

Um dos princípios da criatividade é a quebra de paradigma. Se você tiver preconceito com relação aos livros/vídeos abaixo, começa quebrando o preconceito; você não imagina o quanto você vai aprender. 

1) The Element How finding your passion changes everything, do autor Ken Robinson;
2) Palestra da Elizabeth Gilbert sobre criatividade:
http://www.ted.com/talks/elizabeth_gilbert_on_genius?language=en

3) Palestra da poeta americana Sarah Kay:
http://www.ted.com/talks/sarah_kay_if_i_should_have_a_daughter

Para palestras sobre ideias e criatividade, dentre outras:

4) Aprender outro idioma é uma misteriosa fonte de entusiasmo e novidades;

5) Ouvir e conversar com pessoas que pensam de modo diverso (ou contrário) ao nosso é uma forma de desenvolver tolerância e abrir a mente;

6) Caminhar, dançar e meditar inspiram qualquer ser humano;

7) Conversar com familiares é descobrir o tesouro que temos em casa. Inspiração debaixo do nosso nariz;

8) Escrever diário (ou repetir um exercício criativo diário) organiza o pensamento e induz à disciplina. 

Se você souber de algum curso (de preferência online), livros, blogs que inspiraram você, por favor, sinta-se à vontade para compartilhar. 

Tentativa de sedução, na surdina

Neste espaço, tenho que parecer o máximo, sem dizer. Compreende? Tenho que contar façanhas, de modo que você conclua que sou isso aí. E deve ser dito em terceira pessoa.
Ela é assim, gosta disso, e sabe daquilo outro... No curso deste parágrafo, você já teria que estar impressionado, ter suspirado umas três vezes, imaginado aquelas façanhas e se dito ”baralho” (trocadilho, pois não sei se você é menor de idade).
Sejamos francos; nenhum de nós dois está com essa disposição. Sei que deveria falar só por mim, mas também me importo com você. Afinal, jogamos um frescobol cibernético; eu escrevo de cá, você lê de lá e murmura alguma coisa incompreensível. Você não me cobra (pode deixar que eu já faço isso); e pra sua sorte, eu não posso cobrá-lo... (Mas se eu pudesse o faria, sem dizer).
E assim a gente se mantém em movimento; você considera a hipótese de sair um pouco da rotina do seu trabalho, sem ser visto, e eu entro na rotina para exercitar o meu shrgrum (é a palavra que uso para chamar o processo criativo; não uso essa expressão, porque pode desandar).
Aceita a proposta?
Não precisa responder agora. Não se trata de “ame-o ou deixe-o”. Nos dias em que você estiver sem aptidão, esperando seja lá o que for, você sai daí, dá uma volta, depois você vem aqui ao sertão livre, e a gente recomeça o jogo, como quem não quer nada.

domingo, 17 de abril de 2011

Meus mares

Nem sempre eles tiveram essa aparência de águas claras e cristalinas...

Houve um tempo em que o mar era turvo e não me dizia nada. Eu sonhava todos os dias a mesma coisa, eu via os dias absolutamente iguais, eu repetia todos os dias os atos de uma cartilha. Eu vivia como num comercial e nadava conforme a música.

Tudo estava perfeito, aos olhos da sociedade. Eu era mais uma naquela caverna que acordava, ia ao trabalho e voltava para casa, e à noite, ao invés de relaxar e dormir, eu pensava como seria o dia seguinte e previa até que roupa iria vestir. 

De acordo com o PIB, um vidão; de acordo com aquela coisa intangível e invisível, um pecado, no sentido original da palavra (“peccus", pés fora do lugar) http://revistalingua.uol.com.br/textos.asp?codigo=11995; os pés, talvez os braços e corpo inteiro, sabiam, de alguma maneira, que aquele mar não era meu.

Eu não conseguia criar; só conseguia repetir, fazer algo de algo já começado; abrir um arquivo e “salvar como”. O meu trabalho havia se transformado numa série de recorte, cole e adapte.

E os meus óculos viam um mar, que me deixava sempre onde eu não estava. Desafiando as leis da física, eu estava e não estava em dois lugares ao mesmo tempo; e fazia algo ausente. Aquela vida dupla não tinha sustentabilidade; alguma medida seria tomada, fosse pelo pé, fosse pelo mar; era uma questão temporal, de trânsito astralógico, ou maturidade, eu acreditava.

Enquanto todo mundo queria “tudo certo e previsível”, eu queria me perder fora dele; usar um sapato apertado para escapar por um calo, incomodar o cérebro com uma paisagem desorganizada. Ousar e me permitir.

Largar “tudo” seria revolucionário. “Tudo” mudaria de um dia para o outro. Radical e simples. Da noite para o dia, uma heroína, e me imaginava, saltando de um trampolim e caindo feito uma ginasta olímpica numa água azul e cristalina.

O que eu não sabia é que se carrega o mar ainda que se saia dele; aquele mar podia não ser meu, mas a experiência, que estava nele, era. Portanto, logo que saltei, vi um abismo; e fiquei me digladiando em pleno ar, tentando me agarrar à alguma coisa.

“Tudo” é um paradoxo; é o que você quer largar, mas é o que você tem. “Tudo” não me pertencia, mas é a garantia da ilusão de possuir. Se por um lado, foi fácil largar “tudo”, porque já não me pertencia; por outro, saí de “tudo” para o nada é desconcertante.

“O que você é mesmo?”

“Transeunte.”

“Hum? Ah, entendo! Trabalha com metereologia?”

“Às vezes.”

Mas eu não queria o invisível e o intangível? Até ali, eu só queria sair de um status para o outro, sem perder nada. Porém àquela altura, o mergulho era inevitável.

No abismo.

E passei tempos sonhando, perdendo a identidade; e sem conseguir criar algo inteiro, tentando juntar os fragmentos naquele labirinto orgânico.

A nova fase é imperceptível a olho nu, porém me acompanhava desde o pulo insólito, e trouxe um presente sem as instruções de uso: o ócio. Por conta dele, aprendi a fiscalizar a natureza. Um dia, não sei como, compreendi o sei lá o que, e me alinhei com o curso natural das coisas. E hoje ando solta, ouvindo as conversas alheias nos cafés, participando dos protestos, fazendo amigos, transeunte, escrevendo, dentre outras coisas que, aparentemente, não são bem vistas pela sociedade dos “tempos modernos”.

Graças aos céus, a travessia continua sendo diversa da que eu imaginei. Por isso, eu me disciplino a improvisar, a pedir ajuda, a carregar o mínimo possível, e a aceitar que esses mares não têm fim.

terça-feira, 12 de abril de 2011

10 Dicas para quem vai morar (ou mora) fora da sua cidade (a 11ª é só para algumas mulheres):

1) Informar-se da cultura do novo lugar é um bom caminho pra compreender o modo de pensar e agir das pessoas;

2) Tentar se comunicar com os moradores locais é fundamental, caso contrário, você corre o risco de montar uma tribo, que vai protegê-la(o) e diverti-la(o), mas que possivelmente a(o) afastará dos mitos, histórias, curiosidades e sabores misteriosos do novo lugar;

3) Não julgar os modos e modas das pessoas;

4) Busque a sua própria rotina; tenha pelo menos uma atividade só sua que a permita ter um bom dia independentemente do(a) seu(sua) pareceiro(a);

5) Não espere o seu parceiro(a) acompanhá-la(o) a algum lugar, vá. A chance de um relacionamento desandar, hoje em dia, é infinita, e se você começar impor condições, a chance passa a ser de 99,999%;

6) Não se chateie se pessoas não lhe derem a atenção e o tratamento que você espera, ou se o seu dia não foi como você esperava; é assim mesmo, alguma coisa tem que acontecer pra gente refletir;

7) Escute as pessoas. Isso sempre deu certo comigo. A maioria das pessoas que encontrei no caminho tinham algo para compartilhar, ou desabafar. Fiz grandes amigos por onde andei (e ando);

8) Não espere que os amigos do seu(sua) parceiro(a) sejam seus amigos; nem espere que as pessoas do seu trabalho tornem-se seus amigos. (Isso pode até acontecer, mas pode não ser comum por onde você anda);

9) Evite comparar a simpatia do brasileiro com a de qualquer outra nacionalidade, pois pode se decepcionar e começar a fantasiar sobre a sua cidade. Quem nasce debaixo da linha do equador, nasce com o riso frouxo; é só isso;

10) Tolere e aceite que a viagem vai só acrescentar;

11) Só para algumas mulheres: aprenda a reconhecer se “esta linda mulher pode ser transformar numa gorila”. Particularmente, sei que posso me transformar na “Conga” (é o nome da gorila que se manifesta quando não estou presente). Por isso, desenvolvi algumas estratégias para evitar maltratar o mundo em minha volta quando ela consegue se manifestar:
a)Preventivamente, lavo as orelhas com água fria;
b)se consigo detectar com certa antecedência a presença dela, vou ao parque mais próximo, porque área verde nos acalma; porém devo confessar que já tomei banho de mar na esperança de a Conga não saber nada, mas ela sabe;
c) em penúltimo caso, imagino que a gorila é do tamanho daquela coisinha que a trouxe à tona, e ela, em geral, sai de fininho;
d) em casos extremos, ameaço nos trancar no armário; na maioria das vezes, ela não resiste, porque uma gorila não aguenta ficar presa quando tudo que ela queria era estar solta por aí. Meu namorado não gosta quando eu me faço isso; ele acha que é coisa de gente insana, mas ele não impede, pois sabe que é para o bem-estar social.
Se você tiver uma estratégia melhor, por favor, compartilhe; a humanidade vai agradecer, um dia. E se tiver mais alguma dica para quem vai morar fora, por favor, compartilhe também.

segunda-feira, 11 de abril de 2011

Crimes & reflexões

Em frente à State Library of Victoria de Melbourne, onde eu costumo estudar e chamar de meu escritório, há um jardim no qual as pessoas deitam-se para produzir melanina enquanto houver sol. É um dos meus lugares favoritos aqui em Melbourne; sento ali com um capuccino; e espero que alguma inspiração caia do céu, ou brote daquela grama.
Enquanto eu aguardava atentamente qualquer sinal da entidade (inspiração), alguém me interrompeu, querendo vender alguma coisa. Pelo tom de voz, tive certeza que era algum drogado que andava solto por ali; nem olhei, fingi que não o ouvi; e ia saindo, quando me dei conta de que ele, naquele momento, estava prestes a se tornar uma vítima do meu desdém.
Num flash de segundos, eu me lembrei de tantas vezes que disse “não” antes de ouvir o final da frase e por ter outros interesses mais importantes; de quantas vezes não me dava ao trabalho de olhar nos olhos de quem me dirigia a palavra ao longo do dia; e outras tantas que virei o rosto para o outro lado, evitando me aborrecer.
E nos próximos segundos, uma sequência de crimes me entalaram, formando aquele nó...
Três garotos queimaram uma pessoa que estava dormindo no centro da cidade. “Pensamos que era um mendigo”, responderam os incendiários.
Outros garotos queimaram um índio, levando-o a morte. Quando interrogados sobre o motivo que os levaram a atear fogo no índio, os acusados responderam "para encontrar alguma coisa para a gente curtir" (depoimento dos acusados, constante na fl. 401 do processo judicial).
Surraram uma doméstica que esperava pelo ônibus, na Barra da Tijuca. “Pensamos que era uma prostituta”, justificaram os agressores.
Homossexuais foram agredidos até a morte por transeuntes, noticiaram os jornais.
A violência gratuita vem há tempos dando o ar da sua desgraça. Talvez porque era direcionada a moradores de rua, ou cidadãos desafortunados, não dei a devida atenção ao assunto; fato é que o vale-crime estava batendo à porta.
E num único golpe, a porta foi arrombada, um rapaz invadiu uma escola e levou o que temos de melhor; os anjos da sociedade, que não tinham culpa de estarem ali.
O executor não deu a chance de esclarecer nada; sumiu da terra. Alguns proclamaram vingança aos parentes do executor, afastando uma possiblidade de uma investigação cautelosa sobre o que culminou aquela ira. O ciclo vai continuar?
E o jovem, que vendia alguma coisa, ainda estava a alguns passos de distância do meu jardim. Ignorá-lo seria uma amostra de violência gratuita da minha parte?
Observo que ele está vendendo a revista que eu mais gosto: the big issue. Vou à sua direção; e ele já estava oferecendo a revista a outros que, deitados ao sol, negavam interesse em comprá-la.
Eu, então, consigo comprá-la. Olho fundo nos olhos fundos dele, querendo redenção; e ele me pergunta como estou.
“Ok”, respondo, percebendo os traços de quem tem histórias pra contar.
“Are you doing ok?” Perguntei.
“Improving. You will enjoy the reading; this magazine has just been released.”
E ele nem imagina que me entregou muito mais do que uma revista de apenas AUS 5,00.

sábado, 9 de abril de 2011

O nosso trabalho de sedução

Isso é que é; melhora a aparência daqui e ajeita dali; assim não tem balanço; se você disser isso, não vai fazer o menor sentido; ele não vai entender. Ainda não está bom; falta alguma coisinha. Está quase. Pode ter altos e baixos, ou ser tórrido, mas o cuidado é fundamental; você nunca sabe o que o outro está pensando.

Qualquer enguiço, recomeça tudo de novo; e de novo; e de novo. Às vezes, parece que vamos chegar ao infinito antes que tudo fique prontinho para o momento que se diz ideal. Achar a medida certa de primeira é impossível; nem os mais experientes conseguem.

Tudo isso pelo clímax que dura alguns segundos.  No fim, ele só é bom, porque temos a ilusão de que somos aprazíveis!

Não sei o que você está pensando, mas estou falando da publicação de um texto que escrevi. O artigo 7 good reasons to dance tango foi publicado na edição de abril/11 do Tango Australis. Estou com aquela sensação do pós clímax; percebo aquele olhar lânguido, porém consciente de que o barato mesmo é o ato que o precede. Escrever.

quarta-feira, 6 de abril de 2011

Leitores (des)contados

Pode não parecer, mas eu tenho “assim” de leitores. Recebi vários emails pelo texto “Quase 30 horas”. Seria mais honesto dizer que tenho “a cinco” de leitores; e seria mais preciso contabilizar quatro emails. Não importa, há que se começar por algum numeral.


Um amigo comentou “o texto começa melancólico mas depois decola”. Talvez eu esteja exagerando, como de costume. Ele escreveu levanta ao invés de decola. O texto falava em avião, por que ele não usou a palavra decola? Será que ele prefere o som nasal daquela palavra? No email, ele explicou também que correspondi às expectativas; depois me confundiu, narrando com o seu jargão polido a história de um estagiário que lhe correspondeu à expectativa; o estagiário não fez nada e era o que ele esperava. Na busca de uma segunda opinião, liguei para o meu namorado pra perguntar se ele achava que levanta e decola são sinônimos.


“Ninguém nunca imaginou que esta linda mulher se transformaria num gorila”. É como eu me sinto quando o meu namorado não me atende. Porém, nós dois sabemos que é melhor que ele não atenda, pois ele sabe que se trata de alguma coisinha pequenina que eu transformei num pandemônio momentâneo.


Li, reli e analisei uma dezena de vezes o email do meu amigo. Foi claramente um elogio. Elogio de amigo que empresta cartão de crédito não conta? Então, três é o número da sorte de leitores.


Minha irmã enviou um email, dizendo esperar ansiosamente o próximo post. Não pode contar parente? A multidão de seguidores acabou de se reduzir a um par perfeito.


Minha comadre garantiu que fez um comentário “carregado de emoção e impulsividade” mas que ocorreu um erro no envio. Comadre é parente?


Só restou um leitor. O único, ou a única. Amiga, que se sentiu parte da história, é suspeita?


Zerou o taxímetro. Nada como recomeçar bem.


Só um pouco de rodeio pra agradecer por terem lido o longo post Quase 30 horas.



segunda-feira, 4 de abril de 2011

Quase 30 horas

Passei duas semanas no Brasil, imersa na burocracia e na melancolia das inevitáveis comparações. Depois de tudo, ou apesar de tudo, o Brasil é a minha casa, a casa dos meus amigos e parentes importantes.

Viver em trânsito pode nos fazer sentir mais esperados pelos amigos e familiares. Quem fica sabendo por onde você anda, dá logo um jeitinho de ir ao seu encontro.

“Fala da sua rotina.” Esse foi o pedido que mais escutei. Falo brevemente sobre o meu thankless job de lavar, passar, cozinhar... E logo sou interrompida.

“Não. Fala desde o início: você abre os olhos de manhã, e aí?”

"Medito, acordo o meu namorado, faço o café da manhã, arrumo a casa, faço yoga, tomo um banho, toco piano; depois tento escrever alguma coisa, empaco; cozinho, almoço; e vou à biblioteca para me concentrar melhor, pois lá não tem geladeira nem fogão. Antes de entrar na biblioteca, tomo um café, jogo uma conversa fora com os frequentadores mais assíduos; e, em seguida, me dirigo à State Library of Victoria, meu escritório. Escrevo, empaco, leio, escrevo, empaco. E volto pra casa pra fazer o jantar. Às terças, estudo italiano, às quartas, almoço com uma amiga, às sextas, danço tango; aos domingos, lavo e passo a roupa; e todos os dias leio e faços os exercícios do meu online social media course."

“E você está vivendo de que?”

“Do dinheiro que eu economizei”, respondo.

Meus amigos contam como andam trabalhando; e eu logo percebo que eles estão ficando ricos. O mercado brasileiro parece a Wall Street na década de 80. Greed is good, um amigo comentou . As minhas amigas descrevem a emoção de ser mãe e o dark side pós gravidez. Concluímos que ser mãe é um hard thankless job, porém elas garantem que vale a pena. Outras amigas falam do trabalho e dos planos de viagem. Eu imploro que venham me visitar. Ninguém me deu sinal de esperança.

A viagem teria sido perfeita se não tivesse sido tão curta e intercalada por voos tão longos, em especial o retorno à Austrália. Voamos do Rio a SP, onde esperamos por quatro horas até o próximo embarque; depois enfrentamos 13 horas de voo até Doha; de Doha à Melbourne, mais treze horas enclausurada e comprimida. Não sei se eu deveria contabilizar os três dias subsequentes à chegada, estávamos aparentemente dispostos até que de repente nos assolava uma desídia irresistível. Durante esses três dias, dormi por volta de oito da noite. Eu já tinha ouvido a expressão “o corpo fala”, porém me deparei com a máxima “o corpo apaga”. Shut down.

Não escolhi. Calhou de ser segunda-feira o dia que pretendo voltar a escrever. Tenho até medo de falar assim e tudo ir por água abaixo. Sei que é o dia impróprio para o (re)começo, porém eu já tenho uma boa desculpa se tudo der errado. É segunda-feira. Hoje entendo melhor as pessoas, que fazem dieta, bem como, aquelas que pretendem voltar a fazer exercício às segundas-feira. Você prepara tudo e, ainda assim, uma enorme icógnita te acompanha o dia todo, impedindo qualquer previsão.

“Vou conseguir?”

“Nao sei” (a gente se responde; falo “a gente” porque estou segura de que o pessoal da dieta está me acompanhando em coro).

“Tenho que produzir algo.” (Eu me digo).

“Escreve aí essa lenga-lenga que você está pensando. Não para de digitar. Digita, digita, digita.” Esse que vos fala é um dos mentores da minha comunidade mental. Por favor, ignorem-no.

Já me levantei umas três vezes da cadeira. Uma pra beber água, outra pra ir ao banheiro; e a terceira vez não soube identificar o motivo, por isso, me sentei e me levantei mais umas três vezes consecutivamente sem sair do lugar; se alguém visse, ia achar que eu estava brincando sozinha da dança das cadeiras, em silêncio.

São quase meio dia e meia e até agora tudo que consegui foi saciar os meus inesperados desejos. Há três meses eu não nadava; justo hoje senti uma coragem louca de nadar; me imaginei atravessando o Pacífico. Depois de nadar, pensei que me sentaria pra escrever. Nada. Fiz um bom segundo café da manhã e às 10:40 am, comecei a fazer o meu almoço. Às 11:30 eu estava comendo.

Resolvi mudar a estratégia. Ao invés de sentar pra escrever, vou ler os meus emails e respondê-los, pra aquecer o movimento manual. Funcionou. Li um email de um grande amigo, que dizia esperar ansiosamente o próximo “post”, dando um mote: “faz um relato sobre a viagem de 30 horas”. A palavra ansiosamente é exagero meu, porém o email é verídico, posso provar, se for necessário.

Devo confessar que me preparei bem pra esse cárcere aéreo. Tinha na bolsa dois livros. Só li um deles: “Cartas a um jovem escritor”, do Mário Vargas Llosa. É um ótimo livro para bons leitores e para um escritor preparado, pois o autor cita exemplos advindos de obras clássicas, tais como “Os miseráveis”, “Ulisses” e “Dom Quixote”. Ao longo da leitura, visualizei um abismo colossal entre mim e o livro, pois os três exemplos mais recorrentes eu não havia lido.

“Precisa registrar que não leu?” (é o velho mentor da comunidade novamente. Pule para o próximo parágrafo). Não sei quem falou que escrever é uma atividade solitária.

Tomei conhecimento que Victor Hugo levou 30 anos escrevendo “Os miseráveis”; a obra (tijolo) Ulisses passa-se em 24 horas; e Dom Quixote é um livro dentro de um manuscrito. De modo que tem luz no fundo do abismo, o livro prepara o jovem escritor para ler essas obras clássicas e compreender o mistério da babuska nos livros; uma história dentro da outra, para encantar e prender o leitor.

Não li o livro de uma tacada só. A leitura foi intercalada por pensamentos e conversas com a comunidade invisível. Numa dessas conversas, discutimos se o avião era ou não um transporte público. Para você isso talvez não pareça crucial, mas pra mim é, pois, ultimamente, parte das minhas histórias, escrevo enquanto estou em transportes públicos; naturalmente os dados tomam forma.

Elevador, por exemplo, não me parece um transporte público, considerando que não logrei êxito na criação completa de uma história. Tudo que consegui foram frases.

“Entrou e saiu, sem dizer uma palavra.”

“Entrou, olhou, reconheceu o constrangimento coletivo, baixou os olhos e permaneceu assim até a saída.”

“Entrou, não se reconheceu no espelho, e passou o resto do dia pensando nisso.”

Depois de horas mentais e minutos reais (em voos longos os minutos duram horas) de um solilóquio suspeito, concluímos que o avião funciona como transporte público, no que tange à confecção de histórias constituídas de material de sonho. Um sonho pode não fazer sentido depois que acordamos, porém enquanto dormimos não questionamos a lógica nem a coerência dos fatos ocorridos. Da mesma forma se dá com uma história confeccionada no ar do transporte público; aparentemente é bem sucedida, porém nada garante que fará sentido no papel.

“Eu quero uma torta igual a de ontem. E vocês?” , perguntou a Belga.

“A torta”. Pensou alto Marie, olhando o cardápio e se deleitando por ter se lembrado do sonho daquela manhã.

“Ele falava da repetição. Eu estava estudando o comportamento do turista. O turista é aquele que viaja e sai da rotina; no entanto, quando encontra algo que lhe apraz, começa a repetir”. Relatou Marie, algumas horas antes do voo, enquanto tomávamos café, os fatos ocorridos no dia anterior naquele mesmo local. Em seguida, ela me aconselhou: “ escreve sobre a diferença na repetição e a repetição na diferença.” O sonho dela não havia me parecido tão complexo até ouvir aquela sugestão de título. Fiquei me sentindo uma traficante de sonhos, sem saber o que fazer com aquela matéria-prima.

Em teoria, as histórias ficam bem encadeadas. Na prática, elas tomam um rumo próprio; só existem se quiserem.

Outra história que me soou perfeita no ar diz respeito às conversas que tive com os meus parentes. Enquanto conversava com a minha tia, expliquei o que todo mundo quer saber (o que eu estou fazendo aqui) e lhe contei sobre o meu sonho de escrever.

“Por que você não escreve sobre as particularidades daqui? O bar das divorciadas. Até hoje só entra divorciada lá. Ou sobre o bar da Miúda? Só entra homem casado, pois as esposas dos respectivos confiam que a Miúda não deixa entrar mulher. Isso existe por onde você anda?”

"Não, tia. Por onde eu tenho andado, as mulheres estão no comando. Está escrito na moeda de um dólar australiano: girl guides Australia."

“É, minha filha? Se essa moeda chegar por aqui, a dona Miúda vai falir. É melhor você não escrever sobre isso não; vai acabar te causando vergonha por aí”.

“Tia, eu estava pensando em escrever sobre sabedoria popular.”

“Tenho uma ótima. Quando eu comecei a fumar, eu era novinha, aprendi que baforar parede branca tirava o cheiro do cigarro; "efeito cal". Essa sabedoria dá uma post?”

“É verdade isso, tia? Quero dizer: funciona?”

“Nunca ninguém descobriu que eu fumava”.

Em relação à sabedoria popular, minha irmã, que também participava da conversa, acrescentou que um amigo lhe garantiu que comer papel depois de beber tira o cheiro do álcool da boca. Em várias ocasiões, ela presenciou o amigo comendo papel, depois da noitada.

Quando a minha avó, de oitenta anos, chegou à sala onde estávamos, também lhe perguntei se ela tinha algum exemplo de sabedoria popular. Ela falou que o google tinha resposta pra tudo; e que ela não se sentia mais à vontade pra usar os tratamentos antigos; o único ao qual ela ainda se valia era o São Longuinho.

“Ô meu São Longuinho, se eu achar os meus óculos, dou três pulinhos.”

“Nenhuma mais, vozinha?”

“Existem aquelas que ninguém acredita.”

“Por exemplo?”

“Baforar parede branca pra tirar o cheiro do cigarro da boca”.

Trinta horas de voo. Temo que você não aguente, se eu continuar até o desembarque. Fico por aqui. Boa semana.