segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

Ele está no meio de nós

Por favor, não se iluda com o título do texto. Não pretendo falar de espiritualidade nem religião. Se a ótica fosse espiritual, talvez a minha questão pudesse ser considerada até mesmo demoníaca. Se fosse o caso, pretenderia conseguir a minha redenção, dando “a cara a tapa”. Feito esse introito, exponho o que me aflige.
Algumas pessoas sabem que eu pretendo escrever um livro; outras sabem que já comecei; e as amigas bem próximas sabem que eu de fato escrevi. Logo que finalizei o livro, ou melhor, achei que tinha finalizado o livro, estava ansiosa para enviá-lo a uma editora. Porém antes disso, pedi a uma amiga, que acompanhou de perto boa parte dos capítulos, que lesse o livro. Uma semana depois, ela me veio com um relatório, bem elaborado, e uma série de observações. Tudo que ela reportava era recheado de consistência. Olhando hoje, friamente, o relatório estava infinitamente melhor que o livro. Mas os meus olhos não estavam prontos pra enxergar, apesar de ter visto beleza naquelas informações, que explicavam inclusive o racioncínio da história, algo que eu não tinha parado para elaborar. Aconteceu naturalmente, acho. Entretanto, segundo a minha amiga, que expressou a sua opinião sem qualquer formalidade, como fazem aquelas pessoas que nos estimam respeito e sabem que podem dizer o que pensam: “o mote é atual, você conseguiu desenvolver bem até aqui; a partir daqui (ela apontou um capítulo), você viajou na maionese”.
Não me abalei. Eu estava tão “segura” do que tinha feito que não dei ouvidos ao que ela dizia. Eu escrevi segura entre aspas, porque me dei conta de que eu não estava segura; eu estava orgulhosa, cega e surda, achando que tinha escrito um best seller. Uma voz dentro de mim dizia em alto e bom som que tudo estava o máximo e que a minha amiga não havia compreendido o modo anticonvencional que eu havia usado para passar a mensagem. Um parêntese agora sobre algo que pretendo deixar claro: eu não via sob a ótica dela, porque não conseguia. Outro detalhe essencial: essas opiniões enaltecedoras sobre o livro não eram minhas, eram da voz e do orgulho, que estavam me parasitando. Sei que soa contraditório, mas não era eu. Se você tem essa voz dentro de você, tome ciência do seu monstro, porque ele cega, ensurdece, e dizem por aí, que ele é capaz de matar.
O mais irônico de tudo isso é que a voz, à qual acabei de me referi, é personagem do livro. A propósito, minha amiga e eu lemos alguns livros a repeito dessa voz e discutimos inúmeras vezes sobre esse personagem, que parece intrínseco não só às outras personagens como a nós mesmas. E quando nos demos conta disso, estávamos em êxtase, porque de algum modo nos sentíamos mais livres. Em razão dessas conversas, lhes demo um nome; a voz passou a ter o nome de Gregório.
Eu cheguei ao ápice da arrogância, achando que estava imune àquela voz; e a minha amiga, não sei se consciente ou não, desistiu de repetir o discurso de que eu estava no mundo da lua. Nesse meio tempo, finalizei o livro. Foi justo nesse ínterim que o Gregório, usando das suas artimanhas, tratou de me presentear com um véu; e aos pouquinhos soprava no meu ouvido: “que livro, hein?! Só você mesmo pra escrevê-lo”, me convencendo de que eu deveria enviar o tal livro a uma editora, sem mesmo pedir opinião da minha amiga-editora.
O que ninguém sabe ainda é que eu apresentei o livro a uma editora; e ele foi rejeitado. Não preciso enfatizar o quanto o Gregório ficou em frangalhos; ele não conseguia ver os próprios erros. Quanto a mim, fiquei sem palavras, diante da armadilha do Greg, e fiz o que qualquer pessoa em sã consciência faria: liguei pra um anjo que, como se soubesse do que houve, disse o seguinte: “minha filha, é porque não está pronto; largue de besteira e não vá escutar voz(inha) por aí, dizendo que esse negócio tá bom, não. Vá escrever”.
Minha amiga, pra você que me perguntou o que havia acontecido pra eu ter tido o insight de reescrever o livro, aconteceu como descrito acima. Eu me explico bem? Já estou reescrevendo. Obrigada por você existir. E por que não enviei essa mensagem só pra você? Porque queria expor o meu Gregório ao máximo de ridículo, para ver se ele cria vergonha e me dá uma trégua. Ou seria ele já atuando e dizendo: mostra o quanto você é humilde? Vai saber!? Só sei que ele está no meio de nós.
Com ciência do Gregório,

Eu, ou talvez menos eu, ou mais eu.

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