sábado, 31 de maio de 2014

O que eu gostaria de ter me dito quando eu tinha vinte anos

Você cometerá mais erros amorosos do que na sua adolescência; estará disposta a adaptar-se ao outro em troca de um amor, que ouviu falar, e acredita piamente que sabe do que estão falando. Nessa busca inglória, andará em círculos, tentando retê-lo. Para a sua sorte, até hoje nenhum elo factício mostrou-se capaz de unir corpos celestes. 

Você encontrará pessoas maravilhosas por quem vai apaixonar-se e ser correspondida, perceberá novas cores, conhecerá novos amigos e sentirá a felicidade. Num instante inexato, você, sem saber como ou por que,  vai vê-las escapando pelos seus dedos, e, quando menos esperar, vai sentir-se tão incompleta quanto antes. Não compreenderá o desencadear dos fatos e desconfiará que a culpa é do outro. 
Ledo engano, o que você está buscando ainda lhe é desconhecido. Vão surgir outros, que também vão passar. Você experimentará tantas frustrações amorosas, que vai perguntar-se por que logo com você isso acontece. 

Por outro lado, você terá, bem antes dos trinta, o que inúmeras mulheres das gerações anteriores lutaram com unhas e dentes para conseguir; você terá independência financeira, emocional e liberdade de escolha. Contudo, para sua surpresa, a combinação desses fatores, por si só, não garante a esperada satisfação.

Diante de tantas opções e possibilidades, você, ao invés de se perceber perdida, vai dizer-se resolvida e mais exigente; isso será só teatro, você nem imagina as veredas estreitas pelas quais andará. Apesar disso, não vai convencer ninguém a namorá-la de verdade e vai desejar que algo aconteça na sua vida para que se sinta bem. Você será vítima dos seus desejos anônimos, e vai chorar inúmeras noites.

Depois de chorar bastante e de se arrepender de todos os envolvimentos equivocados, que compõem quem você será quando te escrever, você voltará a conversar com os seus fieis diários e se perguntará por que um dia os abandonou. Com eles, você desvendará lugares inusitados, “de dentro pra fora, de fora pra dentro”

Alguns anos vão passar sem você perceber, porque ainda será jovem e cometerá erros exasperantes, para só depois compreender que “não tem que estar com alguém, que não quer mais ser o outro, que não vai consertar o outro, nem salvá-lo, tampouco ser salva por ele”; e o mundo será visto como um lugar mágico onde seres entusiasmados convivem. Você vai divertir-se estudando idiomas, viajará bastante e vai arrepender-se de ter parado de estudar alemão. Você vai gostar de ser quem você é, vai estudar, trabalhar, cozinhar com as amigas e vai fazer cursos diversos.

Os assuntos mais variados despertarão o seu interesse, da natureza à mitologia. Você será tão diletante que vai ler sobre parasitas, insetos... uma formiga chamará a sua atenção, porque, embora essa formiga viva em comunidade e siga as regras rigorosamente, ela pode ser vítima de um fungo capaz de se instalar na cabeça daquela formiga, controlando a mente e o comportamento da formiga, transformando-a numa espécie de zumbi, conduzindo-a para lugares úmidos e escorregadios; ela, confusa, não reconhece o caminho de volta ao seu habitat; e em poucos dias, o fungo mata-a de vez, emergindo-se da cabeça da formiga como um cogumelo. 

Criaturas diversas atravessarão o seu caminho, e todos elas dirão a que vieram. Você perceberá que ninguém engana ninguém e se perguntará como conseguiu iludir-se por tanto tempo. Contudo, algumas tentativas insipientes você ainda vai fazer, e quando se observar, não se forjará nem se trairá, seguirá rindo sozinha no seu caminho, feito uma hiena milionária, ao lembrar que já pagou essa conta com juros. Esse metamorfose de formiga à hiena, eu desejo que você faça sem hesitação; a hiena tem características de felino, de caninos e é capaz de amedrontar onças, não tema, siga, você poderá ser o que quiser.

A partir daí, você olhará para as suas frustrações com tamanha ternura que vai cogitar a alteração do seu significado no dicionário: “frustração é um exercício para resiliência”, repetirá silente e risonha.

Você rirá tanto que nem vai perceber quando estiver sendo observada. O seu cúmplice ficará extasiado com as suas histórias de viagem e com a sua capacidade de ouvir as pessoas; ele vai querer viajar com você, e ele será o seu número. Mesmo sabendo disso, você não tentará encaixá-lo na peça que falta do seu quebra-cabeça, porque ele não será o que falta, ele chegará inteiro e também terá um quebra-cabeça a completar. 

Amar é diferente do que você verá divulgado nas redes sociais. No seu meu ponto de vista, amar será uma desculpa misteriosa para transcender a dois, que por um lado pode parecer mais difícil, porque se ver refletido, todos os dias, é um remédio homeopático amargo, e, que por outro, será insólito, porque ver o próprio reflexo proporciona uma visão tridimensional. 

Não que vocês tenham nascido um para o outro, ou que não terão frustrações, entretanto, vão saber que não poderão fazer o outro feliz, sem o esforço hercúleo de cada um de ser feliz sozinho, porque o outro pode um dia querer explorar caminho diverso, e, ainda assim, quem ficar vai saber que valeu, “porque tudo vale a pena”.

Eu poderia desejar-lhe que encontrasse logo um parceiro maravilhoso, porque “que pode uma criatura senão, entre as criaturas, amar?” Contudo, desejo que você sinta a leveza de ser quem é; quando estiver enxergando somente negatividade, troque os óculos e cumprimente com um meneio de cabeça as suas frustrações; quando uma obsessão quiser dominar os seus pensamentos, lembre-se daquela formiga, liberte-se e siga adiante haja o que houver.

Cuide-se, desenvolva os seus talentos, aprofunde-se, erre e se perdoe; alimente-se bem, você precisará de reservas, e, por favor, ligue mais para os seus pais, isso afagará o coração daqueles dois que apostarão nos seus sonhos, por mais absurdos que esses pareçam. 

Em meio a essa jornada, seja carinhosamente honesta com você, e não procure o amor, porque você não é boa em tiro ao alvo no espaço sideral; e os anjos fazem isso com uma precisão invejável. No seu caso, porém, não antes de você apreciar repetidamente as Sonatas 23 e 31 de Beethoven, de escrever mil páginas em diários, viajar e dançar tango, até os pés calejarem de prazer. Você ficará pasma quando se descobrir, você reconhecerá o seu amor e tudo o que ele trouxer a rebote.

domingo, 18 de maio de 2014

Quando se falava na Holanda...

As minhas ideias escorriam por um funil e chegavam à cidade de Amsterdam, não sei se pelo fascínio que ela causa, ou se por total ignorância do que havia ao seu redor; ou melhor, talvez tenha sido por falta de orientação, para soar um pouco mais simpático.

Em conversa com uma grande amiga búlgara, tomei conhecimento do Parque Nacional de Hoge Veluwe, que se situa a uma hora de Amsterdam (de carro, ou a aproximadamente duas horas, de trem); e para quem estiver no noroeste da Alemanha, (perto de Bochum, Düsseldorf, Köln etc), o parque fica a uma hora e meia de trem.


O Hoge Veluwe foi idealizado pelo casal Kröller-Müller;  ele era um homem de negócios, fascinado por caça, e ela apaixonada por arte. Dessa união nasceu o parque, que une arte e natureza.



Esse parque cobre uma área de mais de cinco mil hequitares, é sinalizado, apresenta paisagens diversas, animais como raposas e alces vivendo livremente; o parque contém ainda restaurantes, o museu Köller-Möller e um jardim de esculturas.







O lugar é grande demais para ser percorrido todo a pé. Como na Holanda a "regra" é usar bicicleta, há 1.700 bicicletas disponíveis aos turistas, para desfrutarem a malha de ciclovia. A entrada custa 8,70 euros, e o mapa do lugar 2,80 euros. 

Para quem quiser ir um pouquinho além de Amsterdam, vale a pena.

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Mais detalhes práticos: saí de trem de Bochum à cidade de Ede-Wageningen (na Holanda), fazendo baldeação em Duisbug.  Preço: 70 euros (ida e volta). Se comprar com antecedência e utilizando os trens menos rápidos, por sair mais em conta. 
Das cidades próximas ao parque (como Ede), há um ônibus, que sai da estação de Ede-Wageninen de hora em hora  para o parque, e que custa 2,50 euros (é bom verificar os horários do ônibus, para evitar esperar uma hora até o próximo).

sexta-feira, 16 de maio de 2014

Pequenas promessas

No início do ano, fiz uma lista de resolução de ano novo, que poderia, como várias outras, ter se transformado em mais uma lista de desejos. Contudo, não sei se por idade, ou por uma convergência astrológica, que se dá a cada quarenta anos, resolvi levar a sério o meu propósito. 

Antes de me comprometer a mudar o mundo, decidi me dedicar a mudar a mim. Soa piegas, no entanto, não vou me alongar com palavras sofisticadas para dizer que eu não queria levar para o túmulo um bando de textos começados sem um fim, que só dependia de mim.

Nesse intuito, fiz várias tentativas para planejar e executar o que eu havia me prometido. Num primeiro olhar, parecia um debate entre carolas de diferentes religiões, cada uma apostando num santo. 

Eu queria tudo: estudar alemão, continuar escrevendo, frequentar cafés, meditar, viajar, dançar tango e manter meus clientes, que me ajudam na autossustentabilidade, viajar, viajar (eu já mencionei, mas não poderia deixar de enfatizar), e ainda, fazer exercício regularmente (esse ponto está sendo o mais difícil). 

Observando os panfletos dos diversos quereres, eu me dei conta de que tinha que me organizar. Fiz um feng shui aqui em casa, por setor. 

Meu objetivo primordial era (e é) escrever todos os dias no mesmo horário, sem ser interrompida pelo meu ser humano favorito, ou pelos amigos, cinema, curso, e-mail, internet, ou algo do gênero. Por isso, comecei a limpeza pela mesa de estudo, que estava cheia de livros, papeis, contas, postais etc. A mesa continha uma mistura tão bisonha que mais parecia a baía de Guanabara.

Ao me organizar, inseri uma pequena promessa: "o que eu fizer, tenho que fazer por meia hora por dia, pelo menos". Ao me determinar isso, o mundo desvenda dizeres, livros e filmes nos quais os autores dizem isso há anos. Eu me pergunto onde eu estava que nunca tinha ouvido falar nessa preciosidade; provavelmente num café ou numa milonga, eu me respondo com certo acanhamento.

O interessante desses 30 minutos é a eficiência com que eles nos impregnam e a cada dia se estendem. É como se o dia fosse dividido em incansáveis trinta minutos que, em busca de sentido, querem ser utilizados, a qualquer custo.

Voltei a acordar às 5:00 da manhã, não para meditar, mas para escrever, medito mais tarde quando começo a me repetir e antes de dormir. Desde então estou escrevendo religiosamente todos os dias. No início, foi um desafio letárgico, depois de um mês já se assemelha a um hábito. 

Eu fiz as pazes comigo: finalmente eu estou conseguindo, a cada trinta minutos, executar o que eu digo. Vale a pena.


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ps: se alguém do outro lado tiver alguma técnica de boa prática, por favor, divulgue e ajude o próximo a "si" mudar.